sexta-feira, 15 de agosto de 2008

NEY MATOGROSSO - 1981


No segundo semestre de 1980, Ney faz sua primeira tournée na Argentina. Solidificando uma posição até então alcaçada apenas com a constante execução dos seus discos e as críticas favoráveis dos principais jornais e revistas, principalmente a edição dominical de clarin. "Começei a me surpreender na entrevista coletiva - diz Ney -, onde os repórteres sabiam quase tudo a respeito do meu trabalho. Depois eu é que fiquei supreso com a reação do público argentino, participando intensamente de tudo. Me senti em casa." Quem faz sucesso no mercado argentino tem grandes possibilidades de repetir o êxito nos demais países do mercado latino-americano e espanhol. Por isso, a Ariola nova gravadora de Ney Matogrosso, deverá lançar em janeiro de 1981 um compacto simples com as músicas Bandido Corazón, de Rita Lee, e Bandoleiro, de Luli e Lucina em Espanhol. Por outro lado, Ney está voltado para uma conquista mais sólida do mercado nacional. Estréia pela Ariola com o compacto das músicas Folia no Matagal , de Eduardo Dusek e Luís Carlos Góis, e Seu Valdir, de Marco Polo, música essa que foi censurada com recolhimento de alguns discos, mas logo resolvido. "Meu primeiro trabalho para a Ariola - acrescenta Ney - enfrentou um ligeiro problema com a Censura, logo solucionado. Mas não gosto de falar em Censura, prefiro falar em outras coisas." Como, por exemplo do seu primerio elepê para Ariola. Antes de definir o repertório desse disco, Ney pretendia cantar o universo do índio brasileiro, e estava pesquisando repertório através de fitas remetidas por autores. Tom Jobim, inclusive, escreveu Burziguim especialmente, mas que não pôde ficar no disco. Desistiu do projeto e ganhou de presente Amor Objeto, de Rita Lee e Roberto de Carvalho, e redescobriu, através da indicação de Mazzola Homem com H, música inclusive que não iria entrar no disco e show. E mesmo sendo um disco de miscelânea, Ney diz que representa um momento importante para sua carreira". (Revista Amiga, 1981, Reportagem de Paulo Macedo).
"Pela primeira vez eu fiz um show dirigido é bem isso, um show organizado. Por que eu sempre fazia um show de maneira muito unilateral. Isto é, de dentro pra fora aí surgiu o AMIR HADDAD para fazer a direção desse show. Eu conheço o Amir há muitos anos; ele sempre me observou e as coisas que dizia sempre me foram muito úteis. Foi por isso que eu o convidei para fazer a direção. Ele me perguntou qual seria o formato do show. E eu cheguei à conclusão de momentos fortes de outros shows meus, intercalados por músicas do meu último disco e outras coisas que eu gosto de cantar. Foi aí que surgiram os três bailarinos que funcionam como uma memória. Com relação a capa do disco, o gavião real é o maior passáro da América e sempre houve uma certa relação entre minha pessoa e esse pássaro. Muitas pessoas que transam o esoterísmo apontam uma relação entre ele e eu e, aí eu resolvi colocá-lo na capa desse disco, eu sempre quis que ele saísse da minha cabeça, inclusive no primeiro desenho que fizeram para a capa, parecia que ele estava pousado na minha cabeça (risos). Aí eu expliquei que não era nada disso, que era alguma coisa voando da minha cabeça para fora. É um símbolo muito partilar. O pensamento procurando um contato." (Revista Violão & Guitarra, nº 14, Ano II, 1981 - Ney Matogrosso)

O SHOW

Em 03 de junho de 1981, numa quarta-feira, Ney Matogrosso faz a sua priméria estréia no Canecão/Rj. Seria o início de uma das temporadas de maior sucesso em sua carreira. O Custo operacional foi de Cr$8,5 milhões bancados pelo próprio Ney. Enquanto produtor, Ney é responsável por uma enorme equipe 23 pessoas, desde Jorge David, o diretor de cena, até uma banda luxuosa, com nove integrantes, que forma a moldura perfeita para uma voz privilegiada em timbre, registro e flexibilidade."Toda a filosofia desse trabalho é cósmica."


O show foi criado para grandes espaços. Depois de um mês no Rio de Janeiro, a troupe se desloca para São Paulo, onde o Anhenbi será o palco das apresentações. A partir daí, serão três meses de viagem por todo Brasil, logo em seguida por uma tournée latino-americana, que começará na Argentina e terminará no México. (Uh Revista, Ney Matogrosso - Extroversão sem limites - Rio, 03 de junho de 1981).
Neste show o roteiro não se fundamenta exclusivamente no disco. Ele é mais uma retrospectiva da carreira de Ney Matogrosso, iniciada há nove anos, (nota da época), com o conjunto Secos & Molhados. Aliás a primeira música cantada no show é justamente Mulher Barriguda, que não foi grande sucesso do conjunto, mas é uma das preferidas de Ney. A idéia era abrir o show com o maior sucesso de Ney Matogrosso quando ele participava com João Ricardo e Gerson Conrad dos Secos & Molhados. Essa música era O Vira. Mas Ney excluiu a música "porque não sei se minha cabeça aguentaria a pressão", diz ele. A primeira música do show é Mulher Barriguda, as demais músicas que compõem o show são: Três Caravelas, Cubanacan, Bandido Corazon, Ribeirão, Amor Objeto, Bandoleiro, Mata Virgem, Deixa a Menina, Ando Meio Desligado, Terra Firme, Viajante, Homem com H (o seu maior sucesso no momento), Planeta Sonho, Folia no Matagal, Vida Vida e Morena de Angola.
As roupas usadas pelo cantor têm merecido comentários. Em uma das cenas, por exemplo, quase nu, apenas vestido com uma calça já chamada de "frente única" (as nádegas ficam completamente à mostra), o objetivo de Ney é, segundo ele, uma proposta de liberdade: "A única coisa que sempre me interessou, e isso eu estou conseguindo, foi deflagar um processo de liberação para todas as pessoas que estiverem atentas. Como o sexo é um grande tabu, ainda, as pessoas se escandalizam, porque vêem no palco a imagem de suas frustrações e seus medos. Sei disso e cada vez me esforço mais para escandalizar. Não acredito nos gestos tipicamente femininos ou masculinos. Essa história do homem ter atitudes de machão é bobagem. Não posso dizer que um cara veja o meu show e saia dali totalmente livre. Mas nada do que faço é inconsciente, no palco, em que a cena desaparece e passa a ser vida mesmo. Quem se ligar em minhas propostas já terá para si um bom ponto de partida".
E, neste show, o que fica mais patente é o ato de liberado de Ney Matogrosso em não se esconder. Pelo contrário, ele se mostra por inteiro, com toda a força numa adequação perfeita de corpo, alma e voz. Aos 40 anos, em plena forma tanto seu corpo quanto o espírito, Ney Matogrosso, nesses tempos de liberdade e, consequentemente de quebra de tabus, dá uma amplitude maior a sua arte enxertando-a com objetivos mais consistentes. A liberdade com ele se mostra é mais do que recursos cênicos, é antes de tudo uma palavra de ordem para a liberdade geral, como ele mesmo afirma.
Este estágio atravessado atualmente por Ney não significa propriamente uma mudança. Ele apenas, dentro de um processo natural de enriquecimento interior, tem acrescentado alguns valores ao seu universo íntimo. A espiritualidade - não confundir com misticismos -, por exemplo, é a sua mais recente descoberta. E sobre essa nova descoberta que ele fala, com um certo pudor, é claro, por temer os rótulos inevitáveis, os julgamentos apressados e incorretos. "Estou me preocupando agora com o espíito, algo que nunca me tocou antes. Mas, eu sabia que, na hora certa, iria me voltar para esse lado homem. Isso não significa que esteja ligado a qualquer religião nem que vá fazer um retiro. Significa apenas que estou procurando a essência humana, que é o que fica. O corpo acaba com a morte". Neste show, que é dirigido por Amir Haddad, a preoucpação foi mostrar os melhores momentos da carreira de Ney. Como não poderia deixar de ser, são relembrados os tempos em que ele era a estrela maior dos Secos & Molhados, o que viria a provocar a desintegração do conjunto, a música Cubanacan remete as lembranças do primeiro show solo, Bandido o sucesso que o desvinculou definitivamente do grupo, Bandoleiro do show Feitiço, algumas inéditas para o show e as suas novas músicas são mostradas no show". (Jornal TV Gazeta, Vitória, Graciano Dantas, 1981).
BANDA ARTE & CIA
Jorjão Barreto - Teclados e Vocal
Pisca - Guitarra e Vocal
Pedrão - Baixo e Vocal
Gerson Borges - Teclados, Percurssão, Vocal
Sergio Della Monica - Bateria
Chacal - Percussão
Chico Sá - Sax-flauta
Darcy Seixas - Trombone
Dom - Trumpete
Direção Musical - Arte & Cia
Bailarinos
Clermont Aguiar - Kiko Guarabira - Luis Carlos Nogueira
Roteiro Musical
Mulher Barriguda
3 Caravelas
Cubanacan
Bandido Corazón
Ribeirão
Amor Objeto
Bandoleiro
Mata Virgem
Deixa a Menina
Ando Meio Desligado
Terra Firme
Viajante
Homem com H
Planeta Sonho
Folia no Matagal
Vida Vida
Morena de Angola

4 comentários:

fabiana alonso disse...

Lo ví ese año en Argentina, inolvidable, ese disco desapareció del mercado, tenía el tema de Piazzolla... que buen momento!Plena dictadura y se animó a venir. Una revista en un kiosko lo ponía en tapa "después de Carmen Miranda no hay otra como yo"
Gracias por el recuerdo.

Vivian Doce Bussada Bertin disse...

Gostaria de saber se existe alguma gravação da música Ribeirão com Ney Matogrosso. Cansei de procurar mas nunca achei.
Se existe é possível achar para comprar?

Rennika Dourado disse...

Boa tarde!
Meu nome é Rennika e sou acadêmica da UFG - Universidade Federal de Goiás e
estou fazendo um trabalho com mais três colegas sobre a canção Napoleão de 1980, do álbum Sujeito Estranho, interpretada por Ney.
Gostaria de saber mais informações sobre a canção.
Ao analisá-la surgiram algumas questões... como por exemplo se há relação da música com o livro ''A revolução dos bichos", de George Orwell. E se essa música fala dos guerrilheiros contra a ditadura Militar ou dos soldados à favor do governo.
Desde já agradeço.

Rennika Dourado disse...

E porque a música é adjetivada de "maliciosa"? Estou a analisar a canção e me deparei com analises complexas e gostaria de saber qual a relação da música com a ditadura.
att