terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

O PRIMEIRO ALBUM DOS SECOS & MOLHADOS

No dia 23 de maio de 1973, os quatro integrantes do nascente grupo, João Ricardo (violões de 6/12 cordas, harmônica de boca e vocal), Ney Matogrosso (vocal), Gerson Conrad (violões de 6/12 cordas e vocal) e Marcelo Frias (bateria e percussão) entram no estúdio "Prova-SP" para gravar o primeiro long play. As gravações são acompanhadas por cinco músicos arranjadores de apoio: Sérgio Rosadas (flauta transversal e flauta de bambú); John Flavin (guitarra e violão de 12); Zé Rodrix (piano, ocarina e sintetizador); Willi Verdauguer (baixo); Emílio Carrea (piano), lançado pela gravadora Continental discos S/A. O total das gravações se deram em sessões de seis horas ao dia, por quinze dias, em quatro canais. Nada muito tecnologicamente excepcional, mas que venderia 300 mil cópias em apenas dois meses, quando a média dos artistas daquele tempo, era de 30 mil. (Dissertação Secos & Molhados - Transgressão, contravenção - Flávio de Araújo Queiroz). "Já tínhamos enviado nossa fita pra várias gravadoras, ninguém ouviu. Até que um empresário, Moracy do Val, que tinha contatos com a Continental, convenceu a gravadora. Ele foi nosso primeiro empresário. Gravamos o disco. A gravadora achou que venderia 1.500 em um ano. Vendeu em uma semana. Como o mercado vivia uma crise de vinil, a gravadora começou a pegar os discos que não estavam vendendo e derreter para fazer o nosso, que vendeu mais de um milhão de cópias em meses. Foi inédito. Só Roberto Carlos vendia mais.
O repertório era composto principalmente pelo João Ricardo e já existia antes da minha chegada.
Eu dava muitos palpites, ensaiando. Ensaiávamos com dois violões - um normal, do Gérson e outro de 12 cordas, do João. O conceito era a palavra, eram basicamente poemas musicados. Era essa a nossa grande distinção. No nosso repertório estavam poemas do pai do João Ricardo, o famoso poeta português João Apolinário. Nossa postura era de rock, mas não fazíamos rock´n´roll. Nossa postura era desafiadora, trangressora, mas o repertório era pop (Ney Matogrosso, 2003).
A capa do álbum é considerada a melhor da história da música brasileira, segundo enquete realizada pelo Jornal a Folha de São Paulo com 146 personalidades da música, fotógrafos, artistas plásticos, jornalistas e outros. "Ficamos lá a madrugada inteira, sentados em cima de tijolos", lembra João Ricardo, "fazia um frio horroroso debaixo da mesa. Em cima queimava, por causa das luzes", continua Ney Matogrosso...."comprei os mantimentos no supermercado, a toalha foi improvisada com plástico qualquer, a mesa era um compensado fino que nós mesmos serramos para entrarem as cabeças". No final da madrugada, o trabalho terminou. "Tinhamos fome e estávamos duríssimos, fomos tomar café com leite. Não sei por quê, mas não me lembro de termos comido os aolimventos da mesa", diz João. (Folha Ilustrada, SP, 30/03/2001).
Antonio Carlos Rodrigues, que clicou a capa, define sua criação como "Fantástica", como estilo e como resultado. A idéia surgiu quando o fotografo viu algumas meninas na praia com o rosto pintado. Surgiu-lhe a idéia de produzir um ensaio nesses moldes com sua então esposa, que era modelo. Com a ajuda do maquiador Silvinho, fez uma série de fotos parecidas com a que está na capa do álbum dos Secos, com a cabeça dela "servida" em uma espécie de bandeja. Eu ainda não conhecia o grupo e quando fiquei sabendo do nome do grupo, montei uma mesa no meu estúdio com ários secos e molhados, coloquei a cabeça deles ali e os maquiei." (Revista Bizz - As 100 Maiores Capas de Discos de Todos os Tempos)





A CENSURA E OS SECOS & MOLHADOS

"Foi em 73, no auge da repressão. Nós éramos uma válvula de escape para os brasileiros. Na época, não se podia expressar nada e a gente seguia um padrão subervisivo. A intenção era chocar, transgredir, provocar as autoridades" (MATOGROSSO, 2003).
"Certa vez, quiseram proibir um vídeo seu, alegando que a maquilagem era de mulher. Calmo, pediu que lhe mostrassem uma mulher na rua com o rosto inteiro pintado de branco e os olhos, de preto, do nariz ás orelhas, que ele aceitaria. Passaram para o rabo-de-cavalo. Ele usava diariamente na rua. Implicaram com o movimento do quadril. Tubo em. Que focalizassem da cintura para cima. Não estava preocupado com isso. Chegaram ao olhar - para eles, extremamente perigoso. Apesar de concordar intimamente que os olhos emitiam uma mensagem interessante, argumentou ue censurar olhar já parecia ficção científica. Liberaram o vídeo" (VAZ, 1992, P. 59). É curioso ainda citar alguns episódio envolvendo o grupo e a censura: "Durante a única apresentação do grupo em Brasília, em plena vigência do governo Médici, o grupo foi informado de que primeiro precisaria mostrar o show aos censores, para obter liberação dos dois espetáculos programados para o mesmo dia num ginásio. Embora acostumados com tentativas desse tipo, que sempre conseguiam driblar, os três integrantes do conjunto perceberam que , daquela vez, era pra valer e sem apresentação prévia não haveria show. Resultado: Familiares e convidados dos censores de Brasília ganharam o privilégio de assistir, sem filas nem tumulto, a um espetáculo exlusivo dos Secos & Mohados, no auge do sucesso. A única vez que o conjunto se apresentou somente para a censura. Foi um exercício de força, uma bela mostra de prepotência do poder. Só que eles eram tão bobos que pensaram que eu ia repetir tudo o que aprontava no palco. Imagina! Essa apresentação não teve nada a ver com o show que aconteceu poucas horas depois. Apesar de eu estar pintado, quase não dancei e me limitei praticamente a só cantar as músicas previstas. No fundo, queria deixar bem evidente o meu mau humor e a falta de vontade de fazer aquilo."(VAZ, 1992, p. 99).