sábado, 16 de fevereiro de 2008

"O Homem de Neanderthal"

Ney enfrentava uma barra muito pesada, tinha que provar que não tinha acabado sua carreira, muito pelo contrário que estava apenas começando. "Na volta de Mato Grosso, depois de quase um mês de descanso, foi assistir a um show de Astor Piazzola e, no final, falou com ele que era cantor e queria gravar uma música sua. Surpreso, viu que Piazzola conhecia o Secos e Molhados, e, ainda por cima, o convidou para gravar com ele na Itália. Não desmaiou porque era controlado. Quando voltou de Milão, com o compacto debaixo do braço, começou a procurar os músicos para formar uma banda. Quem o conhecia do Secos e Molhados e escutava a gravação, tomava sempre um susto: ele estava cantando muito sério músicas bastante difíceis. Márcio Montarroyos, o primeiro músico de quem se aproximou, aceitou o convite para participar da banda, porque considerou o trabalho sério e de ótima qualidade. A opinião de Montarroyos foi fundamental para manter seu ânimo de continuar batalhando: Afinal, já havia percebido que muita gente duvidava dele o tempo inteiro.

No final das contas, a banda reuniu tantas feras que só durou o tempo de fazer o show e o disco: Montarroyos, Guilherme Vaz, Bruce Henry, Cláudio Gabis, Elber Bedaque, Jorge Omar, Chacal e Sérgio Rosadas - todos, empolgados com a liberdade de criação durante os três meses de ensaios. O Homem de Neanderthal estreou no teatro do Hotel Nacional, no Rio, em 15 de março de 75, marcando a volta de Ney, sete meses depois do término do Secos e Molhados. O disco, gravado quase simultaneamente pela mesma gravadora da época do conjunto, registraria o radicalismo da proposta, com macacos e araras gritando, vento soprando e cachoeiras correndo. No palco, o impacto aumentava. Uma superprodução de quase meio milhão de cruzeiros (na época) petendia assegurar que Ney, daquela vez, vinha para ficar. No fundo, uma necessidade pessoal de mostrar competência.
Meio bicho, meio gente, ele surgia no cenário de uma imensa floresta, envolto em peles de animais e parecendo muito mais próximo da natureza em seu estado puro que do civilizado mundo humano. Extremamente agressivo na postura e, ao mesmo tempo, distante com a platéia, Ney não dava um único sorriso durante a apresentação: a insegurança excessiva só lhe permitia buscar o melhor desempenho cênico. O público se deslumbrou. Caetano Veloso lhe disse que o show chegou a incomodá-lo de tão perfeito. Nada Falhou ou foi esquecido. O programa do espetáculo, feito pelo artista plástico Rubens Gerschman (que também cuidou da programação visual do disco), constituia um acontecimento à parte". (Um Cara Meio Estranho - Ney Matogrosso, Denise Pires Vaz, 1992).


MÚSICAS

Homem de Neanderthal - (Luiz Carlos Sá)

Açucar Candy - (Suely Costa e Tite Lemos)

Idade de Ouro - (Jorge Omar e Paulo Mendonça)

Tercer Mundo - (João Ricardo e Julio Cortazar)

No Colo da Tarde - (Jorge Omar e Paulo Mendonça)

América do Sul - (Paulo Machado)

O Corsário - (João Bosco e Audir Blanc)

Pedra de Rio - (Luli, Lucina e Paulo César)

1964 II - (Astor Piazzola e Jorge Luis Borges)

As Ilhas - (Astor Piazzola e Geraldo Carneiro)

Cubanacan - (Lejuana)

Barco Negro - (Piratini, Caco Velho e D.J. Ferreira)

ELENCO

Ney Matogrosso - Tenore Bianco

Claudio Gabis - Guitarra, Bandolim, Sitar

Jorge Omar - Violão, Viola

Chacao - Percussão, finger bells, tambos d´água duplo

Eler Bedaque - Bateria

Bruce Henry - Fender bass, baixo acústico

Guilherme Vaz - piano acústico, e/piano, sintetizador

Marcio Montarroyos - Trompete, flugelhorn, e/trompete, e/piano (na música Barco Negro), berrante

Sergio Rosadas - Flauta, flautim, sax tenor

As Primeiras Apresentações em Carreira Solo.

Em dezembro de 1974, Ney Matogrosso aparece pela primeira vez em um clip gravado para o Fantástico cantando a música "Greensleeves", e muito curiosamente em Inglês, sendo essa a única música gravada nesta língua, e também somente para o especial, pois não fora lançado em disco. E já nessa época já preparava seu novo disco solo e também o primeiro show.
"Pouco antes de estrear o Homem de Neanderthal em 1975, Ney recebeu um convite para participar do festival Abertura, em São Paulo. Consciente da expectativa que cercava sua volta, resolveu caprichar na roupa da apresentação, já que seria a primeira vez que pisaria no palco sozinho. Arrumou uma pele de onça parda e Ricardo Zanbelli costurou o couro no seu corpo - as pernas do animal nos seus braços e pernas, a cabeça enfiada na dele, o rabo pendurado no lugar certo. Ney adorou aparecer assim, mas, por via das dúvidas, surgiu armado com um punhal de chifre amarrado na cintura. Sério, cantou América do Sul e Cubanacan, e, como as provocações não vieram e a receptididade foi boa, saiu um pouquinho menos ansioso quanto ao seu futuro profissional" (Um Cara Meio Estranho - Ney Matogrosso - Denise Pires Vaz).



Ex - Secos & Molhados.

Ney Matogrosso sai dos Secos & Molhados da mesma forma como entrou, sem nada. Permaneceu no Rio de Janeiro onde tinham ido gravar o Fantástico, mas terminou não aguentando o cerco da imprensa em busca de maiores explicações. Desapareceu. Foi para Mato Grosso deixar a poeira baixar, curtindo uma curiosa liberdade: não possuía vínculos com ninguém. Nem com a firma Secos & Molhados, cujo contrato se recusara a assinar e gerara a separação, nem com a gravadora Continental, já que o responsável pelo grupo era João Ricardo. Livre novamente, sem um tostão (gastara todo o dinheiro com os amigos), mas com tempo para imaginar sua vida dali para a frente. (Um Cara Meio Estranho - Ney Matogrosso - Denise Pires Vaz).